Álbum de estreia do trio mineiro traz 12 faixas autorais que passeiam entre o rock alternativo e o pós-punk
Há quem diga que Belo Horizonte junta as quatro estações num só dia. Outros defendem que só há dois tipos de clima na capital mineira: ou o sol castiga, ou a chuva não dá trégua. Esse binarismo climático dá o mote para o primeiro álbum do Dada Hotel, trio mineiro de rock alternativo que lança nesta quinta-feira (23), o disco de estreia: “Dilúvio/Deserto”.
O álbum – disponibilizado nas plataformas de streaming – traz 12 faixas autorais, compostas por Fabio Walter (vocais guitarras e sintetizadores), idealizador do grupo, que também conta com Marcus Soares (baixo) e Victor Piva Schiavon (bateria). O lançamento do disco vem acompanhado por um videoclipe, assim como aconteceu com os dois singles já lançados, que abriram caminho para a divulgação: “In Sane Days e “Ninguém”.
Agora, é a vez da faixa-título, “Dilúvio/Deserto”, que mistura punk, krautrock e surf music, ganhar um vídeo. “É uma música que eu compus em casa, numa tarde em que choveu muito em Belo Horizonte, que é uma cidade que tem só duas estações, dilúvio e deserto. De cinco a sete meses sem chuva nenhuma, tempo seco, sol, rinite; e os outros meses de muita chuva”, reflete Walter.
Segundo Walter, o conceito presente na faixa-título, a única instrumental do disco, acabou sendo o fio condutor do álbum de estreia do trio. “Comecei a pensar em ‘Dilúvio/Deserto’ como um conceito, como uma forma de expressão da própria cidade. Quase como se fosse o yin-yang dos belo-horizontinos. E dá para ir além, já que todo mundo passa por momentos de dilúvio e deserto na vida. As músicas também seguem esse fluxo. De muito e pouco”, reflete ele.
O álbum foi produzido durante todo o ano de 2020, pelo próprio Walter, e foi finalizado por Fabrício Galvani, do Estúdio Galvani, que mixou e masterizou as 12 faixas, além de gravar as baterias e os vocais – com exceção nas faixas “Nazareh (Pank Song)”, “Ninguém” e “Silent Love”, cujas baterias foram captadas no Estúdio Minotauro, por Vinikov de Morais e Daniel Saavedra. O disco também foi contemplado pela Lei Aldir Blanc do governo de Minas.
No som, o Dada Hotel tem uma rota bem definida, que passeia por diversos estilos, apesar de manter as bases no rock alternativo. A faixa de abertura, “Nazareh”, por exemplo, traz ecos do punk dos anos 1970 e da surf music, assim como “Jamais” e a própria “Dilúvio/Deserto”. A balada “Silent Love” remete ao synthpop dos anos 1980 e à soul dos 70. A faixa conta também com um trio de metais composto por João Paulo Buchecha (trombone), William Alves (trumpete) e Gabriel Assad (flauta). Os metais, tocados por Tiago Ramos (sax barítono), também surgem em “Nada de Nada”, que tem influências de psicodelia brasileira, e em “The End”, uma mistura de stoner com o rock de garagem dos anos 60.
“Prince e Bowie foram pontos de partida, mas também vejo uma influência forte do punk e do pós-punk, como The Clash, Blondie e Television. Essas bandas tocavam rock, mas se permitiam ir além disso, subvertendo o próprio estilo e sem perder o caráter de entretenimento do som. E isso sempre me atraiu”, explica o músico, que cujas influências também estão no Brasil, como Tim Maia, Jorge Ben e Marina Lima.
Clipe e estética visual
“Dilúvio/Deserto” foi produzido, em grande parte, durante todo o ano de 2020. A ideia, conta Walter, era gravar todo o disco ao vivo, em estúdio, o que não foi possível devido à pandemia. “Como eu já tinha as demos das músicas, acabei aproveitando grande parte desses arranjos, que eu fiz em casa, e levando para o Fabrício Galvani. A partir daí, gravamos os vocais e as bateriais em cima. Foi interessante, pois criou essa estética que vai do lo-fi caseiro ao hi-fi de estúdio”, explica o músico.
Essa estética se reflete inclusive na capa do disco, uma fotografia analógica feita por Walter durante a pandemia e que retrata uma pessoa só com um pé dentro de uma piscina. A partir disso, a fotografia foi trabalhada pela artista Malu Teodoro, de Uberlândia, que usou o processo de revelação de cianotipia em cima de um papel de cor rosa. “A imagem tomou outra dimensão, indo quase para o abstrato. Tem o pé, que dá uma sensação de tranquilidade, mas ao mesmo tempo de receio; e a água, que remete ao dilúvio, a uma tormenta de emoções e sensacionais”, diz Walter.
A mistura de analógico e digital, em diversos suportes, inclusive, é uma das características da estética da banda, como nos clipes “In Sane Days”, “Ninguém” e no recém-lançado “Dilúvio/Deserto”. O clipe foi gravado em câmeras antigas, sobre um fundo de chroma-key, e finalizado num videocassete. “A ideia desse último vídeo é uma coisa meio nostálgica, como se estivéssemos tocando num programa de TV de uma emissora de baixo orçamento, com imagens passando no fundo. É também uma forma de mostrar nossa ideia e quem somos, já que, em plena pandemia, não conseguimos nos apresentar presencialmente”, finaliza.