Cineasta mineiro documentou lutas sociais e trabalhistas do Brasil nos anos 1990
Cineasta de contribuições essenciais para a produção nacional contemporânea, Joel Zito Araújo é tema da mostra ‘Uma Década Em Vídeo’, que resgata os filmes realizados pelo mineiro no início da carreira em São Paulo. Até domingo (28 de abril), nove produções que abordam temas sociais sob o recorte do Brasil no começo dos anos 1990 – como a organização das lutas sindicais e o avanço do movimento feminista pautado por mulheres negras – ganham sessões gratuitas na tela do Cine Santa Tereza (Rua Estrela do Sul, 89 – Santa Tereza).
A seleção inclui obras como o primeiro trabalho do diretor, ‘Nossos Bravos’ (1987), mistura de documentário e drama que reconstitui as movimentações trabalhistas no Brasil ao início do século 20. ‘Almerinda, Uma Mulher de Trinta’ (1991) resgata a história de uma militante feminista dos anos 1930, em luta pelo direito das mulheres ao voto, enquanto ‘São Paulo Abraça Mandela’ (1991) documenta a visita de Nelson e Winnie Mandela à capital paulista, marcada por encontros com a comunidade negra e movimentos sociais locais.
O curta ‘Retrato em Preto e Branco’ (1992), que traz denúncia sobre a persistência do racismo na sociedade e na mídia nacionais, também integra a mostra. “Esse foi meu primeiro trabalho que chamou a atenção da imprensa nacional e da cobertura especializada. Fui convidado para alguns festivais internacionais na Europa. O trabalho traz um homem negro falando sobre a situação racial no Brasil para o exterior, mandando uma carta para um amigo no exterior. Aproximadamente seis mil escolas adotaram o curta como material didático”, recorda-se Araújo.
‘Eu, Mulher Negra’ (1994) traz relatos pessoais que dialogam com questões de saúde reprodutiva e racismo
Natural do Vale do Mucuri, Joel Zito decolou como diretor na capital paulista ao fim dos anos 1980, com produções filmadas em vídeo e dedicadas à documentação da realidade de exclusão ou marginalização das pessoas pobres e periféricas. “Foram filmes que circularam muito no chão de fábrica, nas redes de TV dos trabalhadores, fora do circuito comercial. Foram filmes que fizeram parte da luta racial e da classe operária”, pontua o também cineasta Vinícius Andrade, que assina a curadoria da mostra em parceria com Álvaro Andrade.
O encontro de Joel Zito com os movimentos sociais e organizações populares da época, como os sindicatos e o próprio movimento negro organizado, fazem destas correntes de pensamento algo como personagens dos primeiros títulos assinados por ele. Um dos filmes que integram a seleção aborda a trajetória de Vicente do Espírito Santo (1949-2011), trabalhador que tornou-se um símbolo da luta antirracista por vencer um processo contra a estatal Eletrosul, de Santa Catarina, que o demitiu em 1992 por discriminação racial.
A vitória do técnico em telefonia convertido em ativista se deu no Tribunal Superior do Trabalho, quatro anos após a demissão, e foi um marco histórico por tratar-se do primeiro caso em que o Judiciário reconhecia a prática de racismo em um local de trabalho. Vicente foi reintegrado ao cargo que exercia anteriormente, por ordem do STF. Joel Zito, atento à relevância do fato, lançou documentário sobre a história já no ano seguinte à decisão, em 1997.
Cena de ‘A Exceção e a Regra’ (1997): Joel Zito documentou avanço histórico da luta antirracista com produção em vídeo
“Há um alinhamento político assumido entre ele e os movimentos sociais. Um dos mais importantes filmes de sua trajetória, e que está presente no recorte a ser exibido em Belo Horizonte, é o trabalho ‘A exceção e a regra’ (1997), em que Joel traz um olhar para as questões raciais ao retratar a luta de Vicente do Espírito Santo. No trabalho, o realizador mostra como o racismo custou o emprego do trabalhador e como as instâncias judiciais trataram o caso”, aponta Álvaro Andrade, curador da mostra.
As entradas para todas as sessões são gratuitas e ficam disponíveis antecipadamente no Sympla. Também é possível retirar ingressos na bilheria do Cine Santa Tereza, meia hora antes de cada sessão.
Sexta-feira (26 de abril)
16h30 | Sessão Vanguarda das Lutas: Mulheres Negras na Conquista de Direitos
‘Almerinda, Uma Mulher de Trinta’ (1991, 25 minutos)
‘São Paulo Abraça Mandela’ (1991, 22 minutos)
‘Eu, Mulher Negra’ (1994, 31 minutos)
Debate com Alessandra Brito
19h | Aula Magna de Joel Zito Araújo em roda de conversa com o grupo de pesquisa Poéticas da Experiência e lançamento do catálogo impresso da mostra
Sábado (27 de abril)
19h | Sessão Das Fábricas às Ruas: Memória e Atualidade das Lutas Trabalhistas no Brasil
‘Nossos Bravos’ (1987, 31 minutos)
‘Memórias de Classe’ (1989, 40 minutos)
‘Homens de Rua’ (1991, 32 minutos)
Debate com Ewerton Belico
Domingo (28 de abril)
18h | Movimentos Negros: Faces de uma Luta Coletiva
‘Alma Negra da Cidade’ (1991, 30 minutos)
‘Retrato em Preto e Branco’ (1992, 15 minutos)
‘A Exceção e a Regra’ (1997, 39 minutos)
Faixa Bônus com material bruto de ‘A Exceção e a Regra’ (1997, 28 minutos)
Debate com Edinho Vieira