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Médica de BH surpreende ao receitar youtubers e intelectuais negros para jovem com depressão

A atitude viralizou na internet e levantou uma importante discussão sobre essa doença silenciosa e os preconceitos da sociedade



Créditos da imagem: André Carvalho + Reprodução/Instagram
Main receita julia
Júlia Alves
14/02/19 às 19:29
Atualizado em 14/02/19 às 19:35

Por trás de uma simples receita médica pode estar uma importante lição sobre aceitação, solidariedade e a contínua luta contra a homofobia e o racismo. Sem remédios, a receita da médica belo-horizontina Júlia Rocha indicava intelectuais e pensadores negros para um jovem de 22 anos, gay, evangélico, negro e morador de uma periferia que sofre com depressão e chegou a tentar suicídio, ficando internado e passando por acompanhamento psiquiátrico. A atitude viralizou nas redes sociais e levantou uma discussão essencial sobre essa doença silenciosa e os preconceitos nem tão silenciosos da sociedade brasileira.

Conceição Evaristo, Djamila Ribeiro, AD Junior, Spartakus Santiago, Juliana Borges e Silvio Almeida estavam presentes na receita que circulou a internet e que já conta com mais de quatro mil curtidas. Para Júlia Rocha, sua indicação ‘diferente’ é um importante complemento ao acompanhamento médico e ao medicamentos.

“Sou especializada em medicina da família e comunidade e, nessa área, é comum individualizar o tratamento dos pacientes. Para mim é muito importante criar esse vínculo e transformar o atendimento em algo mais pessoal”, comenta a médica.

O jovem em questão sofre de depressão profunda e foi internado após tentar se matar há dois meses. Júlia viu que, para ajudar o paciente, era necessário mais que remédios. E, durante o encontro, que aconteceu há cerca de 15 dias, a belo-horizontina viu o peso dos preconceitos da sociedade na doença do jovem.

“Ele já estava em acompanhamento psicológico e psiquiátrico. Já estava usando medicações. A família já estava mobilizada para apoiá-lo, mas pra mim ele precisava se aprofundar no entendimento do seu lugar social como um homem gay, negro e periférico. Tem horas que só enxergando e conhecendo as estruturas que nos oprimem pra conseguir dar o próximo passo”, pontua a médica em seu relato nas redes sociais.


Representatividade importa

Os youtubers e intelectuais indicados por Júlia mostram um quadro realista e importante sobre o racismo e a homofobia no país. Para ela, entender essa estrutura era um importante passo no processo de recuperação de seu jovem paciente.

“A saúde precisa ter um conceito mais amplo, que vai além de só medicar o paciente. Então, quando percebi que o que o adoecia era o racismo e a homofobia institucionalizados em nossa sociedade, queria que ele entendesse isso, essa estrutura que o pressionava e o afligia”, conta a médica.

E uma notícia boa surgiu de tudo isso. Há alguns dias, Júlia reencontrou o paciente no corredor da Unidade Básica de Saúde onde trabalha. “Ele sorriu e me deu um longo abraço. Aquele instante durou uns anos”, afirma em seu relato. Ao questiona-lo se estava tudo bem, a médica conta que ele disse estar melhor e que tinha lido o livro O Que é Racismo Estrutural, de Silvio Almeida, e, até mesmo, indicado para amigos. No final, ainda mais uma novidade, o jovem está namorando.

Conheça o trabalho de alguns dos nomes 'receitados' por Júlia: