05/11/25 às 07:37 - Atualizado em 05/11/25 às 13:09
compartilhe
Belo Horizonte é uma cidade que vive entre dois tempos. De um lado, a pressa moderna dos prédios espelhados e das avenidas largas; do outro, a delicadeza da arquitetura que testemunhou o nascimento da capital. No meio dessa paisagem, há construções que mantêm viva a memória da cidade e revelam como ela se transformou ao longo das décadas.
Pela Rua da Bahia passam, todos os dias, cerca de 25 mil veículos, e um número ainda maior de pedestres. A movimentação intensa não é novidade. Desde os anos 1920, quando ligava a Praça da Estação, ponto de chegada de trens e viajantes, ao Palácio da Liberdade, sede do governo estadual, a via já era o principal corredor da vida política e cultural de Belo Horizonte.
Imortalizada por escritores como Carlos Drummond de Andrade e Pedro Nava, a Rua da Bahia foi palco de encontros e passeios de grandes nomes da cultura brasileira. Por ali circularam poetas e personalidades como Alberto de Oliveira, em 1908, Rui Barbosa, em 1910, e Olavo Bilac, em 1916. Hoje, quem percorre o mesmo caminho encontra memórias preservadas em prédios tombados que ajudam a contar a história da capital mineira.
Confira cinco prédios tombados que guardam a história da capital mineira!
1 – Livraria Francisco Alves
Pintado em tons de cinza e branco, o prédio da antiga Livraria Francisco Alves é tombado tanto pelo Patrimônio Histórico Municipal quanto pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG).
Hoje, o espaço abriga um restaurante, uma loja de sapatos e uma ótica, mas o passado literário continua vivo. Na Óptica Metrópole, atual inquilina do edifício, fotografias antigas de Belo Horizonte enfeitam as paredes, ao lado de um quadro com o Mineirinho, a Serra do Curral e o Viaduto Santa Tereza.
“Nos 100 anos de Belo Horizonte, ganhei o prêmio Gentileza Urbana por restaurar o local”, lembra José Antônio Maia, dono da ótica. O prédio é um dos últimos resquícios da tradição boêmia e intelectual que marcou a Rua da Bahia durante o século XX.
Crédito: Prefeitura de Belo Horizonte
2 – Edifício Cláudio Manuel
Concebido pelo arquiteto Romeo de Paoli e inaugurado na década de 1930, o Edifício Cláudio Manuel é outro símbolo tombado da história belo-horizontina. O prédio, que abriga o Hotel Metrópole, está situado na esquina das ruas da Bahia e Goiás, e recebeu hóspedes ilustres, entre eles, o compositor Rômulo Paes, autor da célebre frase: “Minha vida é esta, subir Bahia e descer Floresta.”
Os detalhes originais foram preservados: o piso em peroba rosa, o revestimento em mármore preto e rosa, o corrimão em latão e as pastilhas coloridas. A pérgula, no topo do edifício, oferece vista para as árvores da Rua Goiás e também é protegida pelo Iepha-MG.
O prédio traz referências do art déco, estilo que marcou construções emblemáticas da cidade, como o Edifício Acaiaca e o prédio da Prefeitura de Belo Horizonte.
Na esquina da Rua da Bahia com a Avenida Augusto de Lima, o antigo Armazém Central chama atenção pelos detalhes em mármore e pelas cores cinza e laranja. Hoje, o edifício abriga o Colégio Minas Gerais e a Drogaria Araújo, mas guarda na estrutura as marcas do passado.
O local já sediou a Academia Mineira de Letras e mantém, em suas vigas internas, vestígios históricos, como antigos anúncios e até uma receita médica assinada por Guimarães Rosa. Cada detalhe é um fragmento do tempo em que o prédio fazia parte do circuito comercial mais movimentado da cidade.
Crédito: Iepha Minas Gerais
4 – Academia Mineira de Letras
Construído entre 1923 e 1924 para ser residência e consultório do médico carioca Eduardo Borges da Costa, o prédio da Academia Mineira de Letras foi tombado pelo Estado em 1988.
A edificação, de inspiração neoclássica, passou por ampliações assinadas pelo arquiteto Luis Signorelli e contou com a participação de artistas como o escultor austríaco Mucchiutti e os irmãos marmoristas Natali. Com fachada imponente e interiores cuidadosamente ornamentados, o prédio é hoje um dos principais centros culturais da cidade, abrigando acervos, exposições e eventos literários.
5 – Praça Raul Soares
Projetada pelo arquiteto Érico de Paula e inaugurada em 1936, a Praça Raul Soares é um marco do urbanismo belo-horizontino. Seu traçado circular, em meio ao padrão ortogonal da cidade, simboliza o encontro entre quatro avenidas: Amazonas, Olegário Maciel, Bias Fortes e Augusto de Lima.
As calçadas em mosaico português trazem elementos geométricos inspirados na cultura marajoara e no estilo art déco. Tombada em 1988, a praça mantém a simetria original do projeto, centrada na fonte luminosa e nos jardins perfeitamente alinhados.
Crédito: Iepha Minas Gerais
Preservar para pertencer
Para o historiador Ismael Krishna de Andrade Neiva, técnico da Diretoria de Patrimônio Cultural e Arquivo Público de BH, conhecer e preservar o passado urbano é uma forma de fortalecer o pertencimento:
“Conhecer a cidade, sua história e seus símbolos nos faz sentir mais acolhidos. A memória urbana cria vínculos afetivos, lembranças de lugares, cheiros e amores, e nos faz perceber nossa importância em meio a um mundo cada vez mais impessoal”, reflete.
As decisões sobre o tombamento e a conservação dos prédios são tomadas pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte (CDPCM-BH), que realiza reuniões públicas mensais. “O patrimônio edificado é um capital simbólico e participa da construção da identidade cultural dos belo-horizontinos”, reforça o historiador.