Festival responsável pela circulação de espetáculos teatrais por mais de 15 cidades brasileiras, o Teatro em Movimento chegou ao 19ª ano com um obstáculo que parecia intransponível: o isolamento social imposto pela pandemia do novo coronavírus. Em pouco tempo, o evento driblou o desafio e se transformou em Teatro EmMov Digital, plataforma que oferece diversas atrações teatrais. A montagem da vez é idealizada por Yara de Novaes, e nomeada (Des)memória. A peça, que possui uma vertente mais intimista e familiar, estará disponível no site oficial, a partir do dia 10 (amanhã), de forma gratuita.
Sobre a montagem
Há algum tempo, Yara de Novaes se surpreendeu com uma foto da bisavó que estava em uma caixa recebida de seu pai e jamais aberta: era uma senhora negra, no final do século XIX, e estava vestida como sinhá. A história ficou adormecida e, ao receber o convite para integrar o CenaWeb, ela resolveu usá-la como ponto de partida para uma investigação dos antepassados, visando entender o processo de embranquecimento sofrido por sua família desde então.
Para montar o quebra-cabeça familiar embaralhado entre dados oficiais, lacunas e memórias, Yara estruturou sua montagem através da linguagem dos games, apostando em uma interação radical com os espectadores. “No teatro jogamos o tempo todo um jogo que não acontece somente no palco e que se completa através de um pacto com quem está assistindo”, reflete a atriz e diretora, que ressalta as muitas possibilidades dramatúrgicas que este novo universo trouxe.
Durante a experiência, o espectador poderá optar por pistas que os levarão para cenas gravadas, entre diálogos, depoimentos e narrações feitas pela diretora e um elenco formado especialmente para a ocasião. Além da equipe artística, Yara contou com experientes profissionais do universo digital, que se tornaram indispensáveis em toda a criação do “game arte”, termo que criou para designar o novo gênero.
O projeto foi batizado como (Des)memória, neologismo presente em um poema da atriz e diretora mineira Elisa Santana.
O processo teve cenas gravadas em endereços icônicos, como a sede do grupo teatral Espanca!, conhecido pela luta por representatividade, e a Praça Minas Gerais, no centro de Mariana (MG), cidade cujo rompimento da barragem em 2015 atingiu em sua maioria a população preta e evidenciou ainda mais o racismo estrutural no país. Esta locação é a primeira imagem vista pelo espectador – ou jogador – ao acessar (Des)memória. A partir de então, ele poderá escolher o caminho pelo qual pretende percorrer durante a sessão.