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Mulheres à obra! Projeto ensina moradoras da periferia a planejar e construir a própria casa

Arquitetura na Periferia vai além das técnicas de construção e empodera as participantes



Créditos da imagem: Bruno Figueiredo/Área de Serviço
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Camila Saraiva
08/02/19 às 21:36
Atualizado em 08/02/19 às 21:36

Empoderar. De acordo com o dicionário Michaelis, o termo significa “Investir(-se) de poder, a fim de promover ações que possam provocar mudanças positivas no grupo social.”. E foi exatamente isso que a arquiteta Carina Guedes proporcionou às mulheres de comunidades de Belo Horizonte por meio do projeto Arquitetura na Periferia. O programa ensina as donas de casa, autônomas e tantas outras moradoras de baixíssima renda a planejar, investir e fazer sua própria obra dentro de casa.

A ideia de Carina surgiu no seu mestrado em 2013 e, como integrante do Arquitetura Sem Fronteiras, ela decidiu ensinar técnicas de construção civil e ajudar as mulheres a pensarem, decidirem e colocarem a mão na massa. “Normalmente a mulher é excluída do processo de decisão de construção da casa, desde o momento de escolher o que fazer até a hora de executar. O senso comum diz que as mulheres não entendem de construção. Só que elas são capazes de aprender qualquer coisa, se não fazem é porque não tiveram oportunidade de aprender”, explica a arquiteta.

Outra razão pela qual a idealizadora do projeto escolheu trabalhar exclusivamente com as mulheres é que, segundo ela, em um grupo misto elas ficam intimidadas pelos homens que geralmente já estão habituados no assunto. “É uma luta também contra o machismo estrutural”, declara Carina.

Além disso, na fase de estudos a arquiteta encontrou pesquisas que mostram que quando as mulheres recebem algum benefício elas tendem a compartilhar com o grupo, pensam na família.

Mão na massa, no cimento...

O trabalho começa com a formação de grupos de três a seis mulheres. As reuniões acontecem semanalmente para planejar as reformas, aprender técnicas de medições, desenho, cálculo de materiais e programação de custos e investimentos. As moradoras ganham um kit com calculadora, papeis, prancheta, trena, canetas e lápis. Essa fase dura de quatro a seis meses.

Para executar a obra, as participantes também podem optar por um microcrédito e ir pagando aos poucos. Os mutirões entre as mulheres também são comuns na hora de levantar parede e economizar dinheiro. Um dos primeiros parceiros do projeto foi a Brazil Foundation. Atualmente, os recursos são adquiridos por edital. Quem quiser ajudar pode doar valores a partir de R$ 12 mensais pela plataforma Catarse.

Empoderamento

O projeto já ajudou diversas mulheres em três comunidades de BH: Dandara, Paulo Freire e Eliana Silva. Além da Carina, a equipe é formada por outras mulheres, como a arquiteta, Mariana Borel, as engenheiras civis, Rafaela Dias e Tereza Barros, a mestre-obras, Cenir Silva, e as participantes de outros grupos que hoje são articuladoras nas comunidades, Luciana da Cruz e Chaeyenne Miguel.

O programa também conta com o apoio de voluntários nas áreas de psicologia, assistência social e arquitetura. “As mulheres são muito sobrecarregadas com todos problemas e a falta de acesso aos direitos básicos. Queremos ampliar a atuação e oferecer uma orientação mais qualificada”, completa Carina.

Cheyenne mora com o filho de 9 anos e trabalha fora de casa limpando vidros, mas não pensou duas vezes e colocou a mão na massa para ajustar o que ela queria dentro da residência. “Aqui em casa eu assentei os pisos e apliquei tudo o que aprendi nas outras oficinas. Também mexi na parte hidráulica do banheiro. Fiz o curso de elétrica e agora vou fazer tudo certo, passar a fiação pela mangueira, cortar a parede”, conta a moradora da comunidade Paulo Freire, que também trabalha como modelo fotográfica.  

“O projeto acrescentou demais, não só a parte técnica, mas a questão de saber que você tem o poder de fazer o que quiser, o que planejar, que não existe isso de serviço de homem. Que mulher pode estar onde ela quiser”, diz Cheyenne.